Mosca Branca

Fiat Uno Turbo: O despertar da força

116 cv turbinados colocam o Uno Turbo 1994-1996 no pódio dos carros brasileiros mais rápidos, nos anos 1990, e antecipam a liderança da Fiat no mercado nacional

Lançado em maio 1994, o Uno Turbo 1.4 foi o primeiro carro turbo de série produzido no Brasil, e a expectativa da Fiat para conquistar uma inédita liderança entre os esportivos nacionais.

Estabelecida aqui em 1976, a Fiat inaugurou sua linha esportiva em 1978, com o 147 Rallye. O lançamento do Uno, em 1984, renovou o fôlego do segmento, com o Uno SX , seguido dos famosos 1.5 R, 1.6 R e 1.6 R mpi.

Antecedentes do Uno Turbo

Os Fiats esportivos se destacavam pelo preço, acabamento diferenciado e excelente dirigibilidade, apesar da potência e cilindrada inferiores à concorrência.

Teste de esportivos nacionais (Foto: Revista Quatro Rodas, julho de 1992)

Nos testes comparativos da imprensa, em geral, baseados em critérios objetivos de velocidade máxima, aceleração, etc., eles ficavam em desvantagem diante dos potentes GM, VW e Ford, o que gerava polêmica entre os proprietários.

Vendas turbinadas

A Fiat vinha crescendo forte na década de 1990 — graças à boa interpretação do mercado brasileiro — e já ambicionava a liderança de vendas. Produzir um esportivo excepcional, que surpreendesse a concorrência era uma boa maneira de reforçar a intenção e atrair mais consumidores. O escolhido foi o Uno, espinha dorsal da linha e a estratégia era inédita para nossos padrões: um motor turbo.

Parte por custos, parte por desinteresse, as montadoras nacionais sempre optaram por uma preparação conservadora em seus esportivos e os kits turbos nos motores a gasolina eram exclusividade dos carros envenenados ou importados.

Novidade?

Uno Turbo italiano versões MK1 1985 e MK2 1991 (Divulgação Fiat/Wikipédia)

Na Europa, o Uno Turbo existia desde 1985, nas duas gerações MK1 e MK2 e ambos passavam dos 200 km/h finais.

A ideia foi importar a mecânica do Uno Turbo europeu, (na segunda geração, MK2) e instalá-la no Uno brasileiro (que correspondia à primeira geração, MK1) e transformá-lo num autêntico “supercarro”. O projeto foi desenvolvido ao longo de 1993 e o lançamento oficial ocorreu em 8 de março de 1994, no Autódromo Internacional de Caruaru (PE). Rubens Barrichello, então jovem revelação da F1, estrelou o evento e o comercial de TV.

Uno Turbo “Tunning”

Padrão Uno com alterações (Fotos: divulgação Fiat)

O desenho era padrão Uno, com carroceria quadrada, frente em cunha, traseira de corte abrupto e lateral retilínea. Para renovar o estilo, a Fiat criou um para-choque exclusivo, em fibra, pintado na cor do carro. O desenho era anguloso, com spoiler integrado, faróis de milha Cibié Serra II nas almofadas e entradas de ar para o radiador de óleo, radiador principal e o intercooler do turbo. A grade também foi redesenhada, embora os faróis e setas fossem os mesmos da linha Uno.

Nas laterais, as molduras dos para-lamas, marca registrada nos unos esportivos, eram pintadas na cor do carro, combinando com as rodas diamantadas 14” em forma de coroa e calçadas por pneus Pirelli 185/60. Sobre a tampa do porta-malas havia um spoiler preto, oriundo da linha R, assim como as lanternas escurecidas. O para-choque traseiro, também reformulado, tinha protuberâncias aerodinâmicas junto às rodas, com o escape à esquerda.

O efeito geral era impactante, parecendo mais um carro customizado do que um modelo seriado.

Cores à parte

Tabela de cores (Infográfico: Victor Bravo Design e Interlakes)

Os Uno Turbo eram oferecidos nas cores Preto Etna, Vermelho Monte Carlo (Vermelho Alpine linha 1995) e Amarelo (Giallo) Ginestra (Amarelo Exploit linha 1995). Porém, a cor Amarelo Ginestra ficou restrita às unidades de lançamento, aproximadamente três, destinadas aos executivos da Fiat.

A Fiat também montou, para treinamento interno, três Unos Turbos na cor Branco Real. Destes, dois se perderam e o último está com um colecionador.

O carro era identificado pela plaqueta “Uno-Turbo-i.e.” à direita do porta-malas. “Multipoint injection” junto ao para-lama traseiro e “Turbo” no dianteiro, escrito em letras pinceladas. Além disso, um discreto friso triangular, cinza, percorria a porta, na altura do capô.

Raras unidades Amarelo Ginestra e Branco Real (Fotos: divulgação Fiat e Facebook Alfonso Rosell)

Traje esporte fino

No interior, prosseguia a estratégia de transformar o modelo popular num “Street Hod”. O painel plástico dianteiro, era assinado “Uno-Turbo-i.e.” à direita e à esquerda, tinha um espetacular quadro de instrumentos, o mesmo da versão italiana, com seis relógios: nível de combustível, velocímetro (240km/h), manômetro da turbina (1 bar), agregado de termômetro e manômetro de óleo e um termômetro de água. As luzes testemunhas se alinhavam em baixo.

Os comandos das setas, faróis e limpadores de para-brisas ficavam nas hastes, ao redor da coluna de direção, junto ao volante exclusivo, de três raios invertidos. Um painel central tinha botões auxiliares, relógio digital, comandos e saídas da ventilação, suporte de rádio e um porta-objetos ao nível do chão, com a alavanca do câmbio. No teto, havia um console, com o sensor de travamento das portas, alarme e luz de cortesia.

Interior caprichado (Fotos: Facebook Brunelli V.A.)

Os bancos estilo “Recaro”, novidade no Uno, possuíam encosto de cabeça vazados e laterais envolventes, mas a forração era de veludo navalhado, cinza, amarelo e vermelho, comum dos Unos 1.6 R mpi, combinando com os clássicos cintos vermelhos. O veludo aparecia também nas laterais das portas, protegida por uma larga moldura de plástico. O puxador ficava ao centro, junto com os controles dos vidros elétricos. E, embaixo, um porta-mapa, anexo à caixa dos alto-falantes.

A lista de opcionais incluía apenas teto solar, alarme, aquecedor, cintos retráteis traseiros, e toca-fitas Alpine.

Cuori italiano

O motor de 1.372cc, importado da Itália, ligeiramente adaptado para a gasolina brasileira, era da família Sevel e produzia 116 CV, com 17 kgfm de torque. A alimentação era injeção multiponto digital, Bosch L3 Jetronic, associada à ignição mapeada, Magneti Marelli Microplex. O resultado final, era anabolizado pela turbina Garret T2 de 1 bar de pressão máxima (limitada em 0,8 bar) acionada pelos gases do escapamento e ativada a partir dos 3000 rpm.

Devido à parafernália do turbo, que lotava o cofre, o estepe era transferido para o porta-malas, reduzindo o espaço da bagagem. O câmbio mecânico Termoli de 5 marchas também importado da Itália era robusto e preciso, semelhante ao usado no Tipo.

Motor italiano e suspenso recalibrada (Fotos: Facebook Brunelli V.A.)

A suspensão, independente nas quatro rodas, foi preparada, com molas reforçadas e amortecedores pressurizados, tendo a altura reduzida em 1 cm. Uma barra de reforço unia as torres dos amortecedores dianteiros, impedindo a torção da carroceria, durante as manobras, conduzidas pela direção hidráulica de série.

O sistema de freios, a disco ventilado dianteiro, e tambor traseiro, vieram do Tempra, maiores e mais eficientes. Mas, não havia disco nas quatro rodas, como na versão italiana.

Sem concorrência

Toda essa preparação levava o carro de 975 kg a 192 km/h e a 100 km/h em 8,9s. Assim, o Uno Turbo passava, de uma vez só, a frente do Gol GTi (180 km/h), do Kadett GSi (185 km/h) e do ex-campeão Escort XR3 2.0i (187 km/h) e assumia a ponta dos carros esportivos mais velozes do Brasil. Embora, continuasse atrás de alguns pesos-pesados como o Vectra GSi (207km/h) e o Ômega CD (204km/h)  

Era tanto desempenho que a Fiat oferecia um curso de pilotagem teórico/prático com Fabio Greco (organizador da Fórmula Uno). O curso ocorria no Autódromo de Interlagos e as aulas duravam um dia, envolvendo os diferentes aspectos da pilotagem esportiva. E não era só marketing, pois a condução do Uno Turbo, em altas velocidades, exigia experiência e perícia, justificando o apelido malicioso de “capota boy”, com os frequentes acidentes envolvendo jovens despreparados.

A manutenção também precisava estar em dia, pois, ao contrário dos outros Unos, não era um carro quotidiano e sim um legítimo “pur sang”.

Linha Uno Turbo 95

Diferença entre os para-choques dos modelos sem A/C, linha 94 e com A/C, linha 95. (Fotos: divulgação Fiat )

Na linha 1995 ocorreram poucas mudanças. Além das novas cores, houve a disponibilização do esperado ar condicionado, opcional, que implicou em alterações na disposição do motor, aumento do peso final, (1.065kg) e o redesenho do para-choque dianteiro, com novas entradas de ar.

Clássico precoce

Ao todo, foram fabricados 1.801 Unos Turbos no Brasil, entre maio de 1994 e abril de 1996. Pouco, frente as 2500 anuais, pretendidos inicialmente pela Fiat.

A produção em si já era reduzida pela legislação nacional que limitava em 2000 unidades/ano, a fabricação de automóveis, com motores importados fora das regras de poluição — o caso do Uno Turbo. O alto preço — por volta de R$ 125 mil atualizados —, a adoção do turbo em outros modelos Fiat (Tempra Turbo/Stile, Marea Turbo) e o projeto do Uno, que já não era novidade, contribuíram para as vendas modestas.

Em 1996, o Pálio chegou e o Uno Turbo foi descontinuado, juntamente com toda família, exceto o Mille SX. O Uno se voltou definitivamente para o segmento popular, onde ficou imbatível, até 2013.

Uno Turbo em destaque no acervo da Fiat (Foto: fiat127club.forumfree.it)

O número dos Unos Turbos originais é muitíssimo reduzido, já que a maioria foi customizada ou acabou em acidentes/falta de manutenção.

Independente da produção, o Uno Turbo sempre foi admirado e reconhecido como um sonho de consumo dos anos 1990, inclusive pelos entusiastas de outras marcas. Para a Fiat é mais ainda: simboliza a ousadia da marca em investir no mercado brasileiro e a futura liderança nacional, que viria nos anos 2000.

Fotos: Facebook Brunelli V.A e Divulgação Fiat)

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Geraldo Costa

Graduado em Letras Literatura, fã dos automóveis antigos em geral e dos “novos antigos”, carros até 1990, dos quais gosta de pesquisar histórias e detalhes. Entusiasta do Fiat Uno, também atua como moderador no fórum online do “Clube do Uno Brasil.”