Mosca Branca

Joagar: a única sobrevivente de uma história de pioneirismo

Joagar

Picape fabricada em 1960 em Jaboticabal – SP foi o último de nove veículos produzidos artesanalmente com componentes nacionais

A pré-história da indústria automobilística brasileira — que tem como marcos a instituição do GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística) em 1956 e o lançamento do Romi-Isetta e do DKW Universal no ano seguinte — registra a criação de alguns protótipos únicos e de automóveis cuja produção foi de pouquíssimos exemplares. É o caso do Pinar, com três unidades fabricadas entre 1950 e 1952 — sobre ele já falamos aqui no Maxicar! — e do Monarca, um esportivo do qual foram produzidos apenas 10 exemplares sob encomenda em 1954.

Outra iniciativa pioneira dessa época foi a criação do Joagar, com nove veículos de configurações variadas, fabricados a partir de 1953, da qual faz parte essa simpática picape vermelha e branca 1960, que é o último veículo da série e também o único sobrevivente.

Além de mecânico e inventor autodidata, Joaquim Garcia era marceneiro, músico e artista plástico. Seu primeiro automóvel foi concluído em 1953, um pequeno conversível com pneus diminutos e motor de motocicleta. Com quase todos os componentes fabricados em sua própria oficina, em Jaboticabal, no interior de São Paulo. O nome do carro, “Joagar”, foi uma sugestão de um amigo e é a junção das três letras iniciais de seus nomes: JOAquim GARcia.

A evolução do Joagar

Quatro versões do Joagar: conversível, sedan, SW e picape

O segundo Joagar foi um modelo sedan de dois lugares de 1956, que tinha motor de dois cilindros e ciclo de dois tempos de 802 cm³, refrigerado ar. Em seguida veio uma pequena Station Wagon com laterais em madeira (woodie). Seu motor boxer de 4 cilindros refrigerado a ar (a mesma concepção dos motores VW) tinha 820 cm³ e rendia 31cv. O câmbio era de três marchas e a tração traseira.

Todos os componentes mecânicos de ambos, incluindo motores e caixas de câmbio, foram projetados e construídos pelo próprio Garcia em sua oficina.

O encontro com Juscelino Kubitschek

Joagar

Garcia (d) mostra a Kubitschek o Joagar. Reportagem da época fala sobre o encontro

Em setembro de 1958, Joaquim Garcia viajou de Jaboticabal ao Rio de Janeiro — então Capital do Brasil — a bordo se sua SW Joagar. Tinha um compromisso importante: o encontro com o Presidente Juscelino Kubitschek para apresentar a ele os detalhes de seu automóvel de fabricação inteiramente nacional. JK gostou do que viu e inclusive deu um passeio do Palácio do Catete ao Palácio das Laranjeiras, como mostra esse vídeo do Arquivo Nacional.

O objetivo de Garcia com aquele encontro era conseguir financiamento para a produção do Joagar em série, com 20 unidades/mês. Mas apesar da ótima impressão e das promessas, o investimento não chegou.

Mas o empreendedor não esmoreceu. Mesmo sem a ajuda do Governo e o financiamento dos bancos, criou a Automóveis Joagar Indústria e Comércio e continuou a aperfeiçoar seu automóvel em todos os aspectos: design, mecânica, acabamentos e processo de fabricação. Entre 1959 e 1960 produziu e vendeu outros quatro veículos: uma Station Wagon e três picapes.

A pequena oficina onde os Joagar eram construídos e o cartão de visitas da Automóveis Joagar

O último Joagar

Como já dissemos, o último veículo com o nome Joagar é a picape vermelha fabricada em 1960, que é o tema central de nossa reportagem. Ela foi restaurada em 2019 pelo neto de Joaquim Garcia, o empresário Ronaldo Girio. É o único Joagar remanescente, dos nove que foram fabricados ao longo de sete anos.

Seguindo o padrão mecânico de modelos anteriores, ela tem motor boxer refrigerado ar de 4 cilindros, mas com 955 cm³ e 38cv. Possui comando de válvulas no cabeçote e duas ventoinhas laterais, para melhor refrigeração, uma para cada dois cilindros. A tração é traseira. O cambio de três marchas tem alavanca na coluna de direção.

Nos anos seguintes, Joaquim Garcia abandonou o setor automotivo, passando a fabricar compressores de ar e bombas d’água. Morreu vítima de um acidente automobilístico em 1976.

Redação: Fernando Barenco
Fotos: arquivo e Murilo P. Brolio, a quem agradecemos especialmente pela pauta

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