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Antigomobilismo de corpo e alma

Jorge Levy e sua bela coleção

GENTE

Antigomobilismo de corpo e alma

Um carismático e determinado colecionador de Juiz de Fora, MG que restaura seus próprios automóveis

[dropcap]Q[/dropcap]uando alguém é apaixonado por automóvel antigo, é comum se dizer: “Fulano tem ferrugem nas veias”. Já virou até clichê! Mas essa reportagem é sobre alguém que tem muito mais do que simplesmente isso. Tem coração, mente, corpo e alma antigomobilista.

Caminhoneiro aposentado, 63 anos, seu apelido lhe foi dado pelo amigo Celso Carvalho, em referência ao bairro Borboleta, onde nasceu e vive até hoje, em Juiz de Fora-MG. Hoje em dia, poucos conhecem o Jorge Levi Mendes Coelho, mas pergunte a alguém do meio antigomobilista da região quem é Jorge Borboleta…

Figura querida e de uma simpatia sem fim, sempre que falamos dele em rodas de amigos, é quase inevitável ouvirmos algo do tipo: “Você já foi à casa dele? Caramba, é um verdadeiro museu do automóvel!”. Fundador e presidente da AVA-JF (Associação de Veículos Antigos de Juiz de Fora), Jorge “Borboleta” Levi atualmente divide seu tempo entre os assuntos do clube — que faz um belíssimo trabalho social — e cuidar de seus automóveis antigos.

FNM 2000 JK
R$ 120.000,00

FNM Jk 2150
R$ 150.000,00

Alfa Romeo 2300 Ti4 1985
R$ 100.000,00

R$ 48.900,00

FNM 2000 JK 1963
R$ 190.000,00

VW Fusca 1300L 1977
R$ 35.000,00

R$ 45.000,00

R$ 32.000,00

Chevrolet Tigre 1946
R$ 170.000,00

Furgão Chevrolet “Boca de Sapo”. Comprado junto com outros 3 de uma panificadora

Fomos à sua casa numa bela tarde de domingo em agosto. O convite foi para uma visita social, para tomar café e comer o gostoso bolo preparado por Maria Helena, sua esposa. Mas já fomos logo avisando:
— Viemos para te visitar, mas estamos aqui a trabalho também!, já que não podíamos perder a oportunidade de registrar tudo o que ele tinha a nos mostrar.

Entre suas antigas profissões, a de mecânico lhe deu a bagagem para hoje fazer a própria restauração de seus automóveis, incluindo mecânica, elétrica, lanternagem (ou funilaria em algumas regiões do Brasil) e pintura. Para terceiros fica apenas o serviço de capoteiro.

Sua casa, no final de uma rua, é uma espécie de cháraca com grande terreno e diversas construções, inclusive uma casa que foi de seu falecido pai e que hoje abriga a sede da AVA. Já na entrada vê-se um Furgão Chevrolet “Boca de Sapo” do início dos anos 50. Comprado há cerca de 2 anos de um lote de 4 furgões para restauro de uma antiga panificadora da região, o velho utilitário espera paciente a sua vez de voltar à velha forma. Dos outros 3, um foi vendido, o segundo está sendo restaurado e o terceiro — em péssimo estado — faz o papel de doador de peças.

Quando o “Boca de Sapo”, estiver concluído, Jorge terá a difícil missão de escolher sua próxima tarefa, pois esperam na fila: outro Furgão Chevrolet; Plymouth Fury SW 1972, resgatado sem mecânica quando estava prestes a ser “picado” com machado e vendido a peso; Bel Air Sedan 1956; Caminhão Ford 1947; três Fords A, sendo um Tudor 1928, um Phaeton 1929 e uma Pick-up também 1929; Chevrolet Special de Luxe 1952; Pick-up Dodge 1953; Chevrolet 1947; Ford LTD 1979, o único nacional da imensa lista; além de um Impala 1965 4 portas sem coluna que já pertencia a ele, tendo placas pretas inclusive, mas que em 2004 foi vítima de uma chuva de granizo, tendo sua carroceria ficado repleta de mini-mossas.

— Nem você sabia que tinha tantos carros para fazer!, brincamos em meio a muitas gargalhadas.
— Meu pai vai ter que viver uns 200 anos para terminar tudo isso!, arrematou seu filho Elerton, mais conhecido como “Lourinho”, um professor de história que nas horas vagas ajuda o pai com os automóveis.

Impala 1965, vitima de uma chuva de granizo e Cadillac De Ville 1964, vítima do antigo proprietário

Somado a todas essas relíquias, encontramos uma mais do que especial, coberta com um grosso encerado de caminhão, bem no meio do quintal. Um imponente Cadillac Coupê de Ville 1964 que não está propriamente esperando restauração e que tem uma história pra lá de curiosa, que vamos contar no box “Os automóveis do ‘Alemão’”.

Peças e acessórios das mais diversas marcas e anos

Peças & Acessórios

Vistos os carros “a fazer” fomos conhecer o “setor” de peças e acessórios de Jorge Borboleta. Divididos em três ou quatro construções é possível encontrar de tudo e mais um pouco para automóveis antigos: rodas, volantes, calotas, dínamos, bancos, pneus, frisos, borrachas, acessórios (alguns raríssimos, disputados a tapa por colecionadores), rádios, bancos, frisos, motores inteiros, latarias, emblemas, tintas das mais diversas cores, grades, faróis… enfim, no que você pensar, o camarada tem ali. Bicicletas antigas há muitas! Mas não são produtos para a venda e sim coisas que ele foi acumulando ao longo da vida e que se transformaram numa bagunça organizada, que ele entende muito bem, quase sempre encontrando de imediato o que procura. Conforme abria as caixas e gavetas, Levi ia descrevendo o histórico daquela peça, guardada exatamente ali por um bom motivo. Certamente um dia terão uma serventia!

Próxima parada, o setor de literatura. A sede do clube esconde em armários e gavetas, publicações dos mais variados tipos, tudo sobre automóvel, é claro.
— Tem sempre alguém disposto a me dar alguma coisa. Pessoas que vão jogar livros e revistas fora e acabam me oferecendo. E eu aceito, é claro!, explica Borboleta.
São manuais do proprietário, de peças e de manutenção, muitos deles em inglês; revistas 4 Rodas, Auto Esporte, Seleções, Oficina Mecânica e também importadas; muitos livros. Material de referência essencial para quem lida com a recuperação de velhas máquinas.

Chevrolet 1948: o favorito

A coleção

Para terminar a visita, fomos conhecer a garagem, onde Jorge Levi guarda com todo carinho seus preciosos bens: os automóveis, é claro!. O há mais tempo na casa e preferido de toda a família é o Chevrolet Fleetmaster bicolor 1948. Há também o Ford Tudor 1933, o Bel Air 1959 (aquele do “Alemão” do box abaixo), o Ford Super de Luxe 1941, a pick-up Ford F75 1970, Corcel 1970 e Fusca 1964. Este último ainda não saiu da garagem desde que foi restaurado. Detalhe: os que precisaram de restauração, passaram pelas hábeis mãos do próprio dono.


 

Os automóveis do “Alemão”

O Bel Air 1959 quando comprado e atualmente. A direita o Cadillac 1967 inteiramente depenado

Lembra do Cadillac 1964 citado acima? Pois vamos contar essa obscura e incrível história, que envolve este e outros carros e que por si só, já daria uma reportagem especial.

O Thunderbird 1971 também ficou perfeito
O Thunderbird 1971 também ficou perfeito

Existia em Juiz de Fora um empresário de origem alemã — cujo nome achamos melhor omitir para preservar a privacidade de sua família — que comprou ao longo do tempo diversos automóveis de luxo. Morador de uma região nobre da cidade, o alemão, segundo consta, teve sérias dificuldades financeiras nos últimos anos antes de morrer. Porém, recusava-se a se desfazer de qualquer um dos automóveis para sanar suas dívidas.

Por alguma razão desconhecida, ele decidiu desmontar os carros dentro de sua própria garagem, retirando partes das latarias, motores, suspensões, interiores e acabamentos. Conforme iam sendo retiradas, as peças eram catalogadas e guardadas em prateleiras, na tentativa de manter tudo organizado, o que foi em vão. O motivo real desta atitude permanece (e talvez permaneça para sempre) um mistério. Dizem que havia a ameaça de leilão dos automóveis e ele esperava assim que os carros não fossem levados embora, já que não podiam rodar.

Um Cadillac teve seu interior desmontado, restando só o painel
Um Cadillac teve seu interior desmontado, restando só o painel

Com a sua morte, em 2008, os herdeiros resolveram por tudo a venda, inclusive a casa, que já não existe mais e que vai dar lugar a um empreendimento imobiliário. Sabendo da história, Jorge Borboleta e mais 4 amigos da AVA resolveram se juntar para comprar 6 carros da coleção: Cadillac Eldorado 1967, Ford Thunderbird 1971, Chevrolet Bel Air 1959, Cadillac Coupê De Ville 1976, Ford LTD 1979 (o único brasileiro) e por fim o tal Cadillac Coupê De Ville 1964. Todos, exceto o LTD, estavam semidesmontados e as peças a essa altura complemente misturadas. Um autêntico quebra-cabeças de peças grandes e pequenas, borrachas, fios, tapeçarias e tudo o mais que se possa imaginar. Só de parafusos, foram encontrados mais de 200 copos de geléia cheios! Foi aí que entrou a experiência e conhecimento mecânicos de Borboleta. Durante 4 meses, ele e seus sócios na compra ficaram trancados na garagem refazendo a montagem dos carros, para que fosse possível pelo menos tira-los de lá, já que a casa teria que ser desocupada em breve. No fim, tudo deu certo e o resultado foi perfeito, já que nada faltava de nenhum dos carros. Pelo contrário, havia muitas peças extras, todas importadas e novas. Na divisão final, coube a Jorge o Bel Air 1959 — que tem participado regularmente dos encontros de automóveis antigos, sempre fazendo um enorme sucesso — e o Coupê De Ville 1964, que será concluído em breve, para a felicidade de quem gosta de ver de perto máquinas maravilhosas como esta. Os demais automóveis foram divididos entre os 3 outros companheiros na empreitada.

Texto e Fotos: Fernando Barenco

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